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Janelas Fechadas

  • Foto do escritor: Carmen Adriana
    Carmen Adriana
  • 21 de mai. de 2024
  • 2 min de leitura

Atualizado: 27 de mai. de 2024

Estudiosos têm chamado a atenção para o desenvolvimento de problemas como ansiedade, miopia, obesidade, dificuldade para dormir e falta de concentração em crianças e adolescentes que passam a maior parte do tempo em ambientes fechados, muitas vezes absortos por telas de celulares e games. Como professora de Redação, ouso dizer que o problema atinge também de forma vigorosa a escrita.

O fenômeno da atenção capturada e  aprisionada por telas parece resultar na baixa criatividade na hora de redigir um texto. Faltam argumentos, falta experiência, falta vivência, falta enxergar o mundo sem filtros.

Quando não estão diante de uma tela em casa, estão nos transportes igualmente envolvidos com seus celulares. Não olham a paisagem, não observam, como  diria o amigo poeta, “as miudezas da vida”. Miudezas essas capazes de gerar  poesia.

Outro prejuízo para o texto é a inabilidade para pontuar o tempo. Os usos de passado, presente e futuro misturam-se sem distinção em inúmeras composições. Qual o tempo da ida até a casa da avó? Uma fase do jogo, um capítulo da série? Qual o caminho para o colégio?  A leitura de alguns posts  no Instagram. Qual o lapso temporal? Qual a influência para a história que eu desejo contar? Não entendem.

Os enredos se desenvolvem baseados em séries de streamings recheadas de incoerências, com preferência para o clima de violência e até mesmo de morte.  Tudo isso porque as janelas estão fechadas. Somente quando enxergo ao meu redor, posso me fazer um participante consciente da realidade, um ser crítico. Posso enxergar agruras, mas também beleza, solidariedade e respeito.

As escolas, por outro lado, principalmente nas grandes cidades brasileiras, ocupam cada vez mais espaços de concreto, com escasso contato com a natureza e inúmeras telas. Chegando ao absurdo de governantes proporem conteúdos criados por inteligência artificial, dispensando o olhar presencial e afetivo do professor, como se isso fosse realmente modernidade ou avanço nas metodologias de ensino. Parafraseando o querido educador, tornam-se gaiolas e não proporcionam o voo livre dos pássaros.

O resultado: crianças e adolescentes  cada vez mais cerceados, acreditando-se livres. Pés descalços, correr na grama, olhar as nuvens, balançar nos galhos de uma árvore, sentir o vento levantando os cabelos através da janela aberta do carro, nada disso se opera mais com naturalidade e, na hora da escrita, haverá ainda aquele que sugira: “Lance o tema para IA”.  Tristes tempos.

Para melhores textos, precisamos urgentemente investir em vivências mais simples e significativas, que agucem os sentidos das crianças, que trabalhem o olfato, o tato, o paladar. Levar os pequenos a ouvirem com atenção os sons da realidade e abrirem as janelas da alma para a vida que se espalha ao nosso redor com suas belezas e imperfeições, mas sempre inspiradora.

 
 

Escritoria - Soluções em Linguagens

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